quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016

Reflexão - Querem matar o rio Tejo, mas o povo não deixará

Tejo poluído perto de Abrantes. Foto de Arlindo Consolado Marques 7fev2016.

Querem matar o rio Tejo, mas o povo não deixará
por Duarte Marques (PSD) in Expresso 16fev2016

«Andam a querer matar o rio Tejo. Têm andado a tentar, há anos. São quase sempre os mesmos, alguns tornaram-se mais conscientes mas outros insistem no crime. Têm estado a vencer, vão à frente neste campeonato, mas felizmente há gente que não se resigna, que não baixa os braços e admito que estamos cada vez mais perto de inverter o equilíbrio de forças. Porquê? Porque a razão está do lado do rio, porque há gente que se preocupa e porque há pessoas que não têm medo. Sim, o medo tem impedido muita gente de actuar e de falar. Há funcionários, ex-funcionários, reformados e autarcas locais que nunca falaram por temer o seu emprego, do seu familiar ou de um amigo. Chegou a altura de unir forças para salvar o nosso rio. Não pode haver mais hesitações.

Depois de vários desenvolvimentos, apesar de muitas fiscalizações, de uma resolução aprovada por unanimidade na Assembleia da República, de dezenas de audições e de análises, o problema da poluição do rio Tejo tem-se vindo a agravar.

Quando tocou a apontar o dedo, alguns acusaram as empresas instaladas em Vila Velha de Ródão, outros apontaram o dedo a Espanha, outros acusaram também o Estado de ser impotente. Aqui ninguém está inocente, uns por incúria, alguns por falta de meios, outros por incapacidade e alguns por crime puro e duro.

Há cerca de duas semanas, recebemos no Parlamento alguns autarcas de concelhos vizinhos do rio Tejo. Dois em particular, o edil de Castelo Branco [PS] e o de Vila Velha de Ródão [PS], quase que juraram a pés juntos que a água já chegava "preta" de Espanha. Achei estranho, mas admiti essa possibilidade. Passados escassos dias encontrei dois pescadores que me juraram a pés juntos que a água, acima de Vila Velha, estava muito mais clara, não límpida, mas não tinha comparação. Seria mesmo assim? Tendo em conta estes testemunhos, muito contraditórios, decidi meter-me ao caminho, ver pelos meus próprios olhos e dar o benefício da dúvida a ambas as teorias.

A pesquisa não deixou dúvidas. Antes e depois de Vila Velha de Ródão há uma diferença abissal, é como comparar preto e branco. Basta encher uma garrafa de plástico transparente com água do rio para notar a diferença. A água acima da descarga de efluentes da Celtejo está quase transparente, daí para baixo está escura, com um cheiro hediondo. Nem todos os dias está de tal forma escura que parece óleo, mas muitas vezes está assim.

Com o vídeo feito neste último fim-de-semana não ficam dúvidas, não me faltam provas para ter segurança em dizer que a Celtejo tem uma enorme responsabilidade na poluição do rio, sim, do nosso rio Tejo. Acrescento a todas estas evidências, os preciosos testemunhos, sob anonimato, de funcionários e ex-funcionários desta empresa, tendo cada vez mais certezas que o problema da poluição do rio Tejo está em Vila Velha de Ródão. A autarquia local bem tenta fechar os olhos, afinal a economia local depende destas empresas. As empresas em causa têm uma postura lamentável, que nada tem a ver com outros concorrentes que, sendo do mesmo sector, não revelam este tipo de comportamento para com a natureza.

A Celtejo tem, aparentemente, uma ETAR sem capacidade suficiente para tratar os resíduos produzidos. Aumentou a produção, iniciou o processo de branqueamento da pasta de papel mas não aumentou a capacidade da ETAR. Não é difícil resolver o problema, até é simples e fácil tratar do assunto sem afectar os importantes postos de trabalho na região. Para tal, basta actualizar determinados equipamentos da unidade industrial, investir em novos tratamentos dos efluentes, construir uma ETAR à medida da produção e, até lá, produzir ao nível da capacidade da ETAR. Há até fundos europeus disponíveis e dirigidos a tal objectivo. Ou seja, não há desculpas para continuar este crime.

Mas o problema não termina por aqui. E já agora, conto mais um pouco da história.
Ligeiramente mais acima, há uma pequena ribeira, a ribeira do Açafal, junto à qual uma empresa chamada CentroOliva usa o bagaço da moagem da azeitona para produzir energia. Eu vi com os meus próprios olhos as descargas contínuas que fazem na ribeira sem tratamento aparente, numa ribeira que desagua no rio Tejo. Acima da descarga a água está límpida, depois da descarga desta empresa a água cheira a azeite reles, tem manchas enormes de gordura em toda a sua largura, um cenário terrível de poluição. Os proprietários são reincidentes, têm um longo cadastro ambiental, famosos sobretudo em concelhos como a Mealhada [PS] ou Sta. Maria da Feira, concelho onde um deles foi até candidato derrotado à liderança da autarquia local. O dito empresário chama-se Alcides Branco [PS] e é um investidor a evitar em qualquer concelho do país. Fica o alerta. Cria pouco emprego, polui muito e, pelo "cadastro ambiental", não tem um pingo de vergonha na cara.

Qualquer uma destas empresas, além de estar a destruir o rio Tejo e, consequentemente a matar o meio ambiente, está a causar graves problemas de saúde às populações vizinhas, cujas verdadeiras consequências estão por determinar. No entanto, as consequências são visíveis também à escala económica perante os concorrentes, que investem no tratamento dos seus resíduos, na proteção do meio ambiente, ou seja, que têm custos de produção muito superiores. (…) »

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